Ele, atlético, alto, com a barba bem feita. Ela, uma dama no auge de seus 37 anos, que poucos diriam sua idade real. Seu corpo revelava curvas que deixavam a todos inertes e seduzidos.
No ir e vir entre um café e outro, surgia um 'oi' desavisado, um olhar mais quente ou, até mesmo, o cheiro do perfume dele no ar. Depois de algum tempo, os breves cumprimentos já não eram suficientes para expressar a química que os atraía. Em uma repartição pública, o tempo é curto, contado.
O tempo urge. O que ruge dentro deles é o desejo da intimidade, cronometrado pelo tic-tac do relógio. A rotina, poucas vezes quebrada pelos compromissos laborais e familiares, não permitia diálogos, nem tempo a sós.
Ele, casado e pai. Marido. Ela, uma dama, esposa e mãe. A rotina vira tédio e o tédio, adultério. Ou quase isso. Um café não tira pedaço. Uma carona não é nada demais. Um bilhete é só um pedaço de papel.
Uma hora, uma ligação. Um recado no computador. "Podemos nos ver depois?". O carro dele corta a noite chuvosa. O dela, logo atrás.
Um quarto escuro, sem janelas. Apenas um leito oval. O cheiro? De mofo e desinfetantes baratos. O espelho no teto, firme e brilhante. Sorrisos.
Um beijo longo. As carícias reprimidas se esvaem entre os dedos dos dois. O úmido do quarto molha os corpos. A paixão é apressada, um esquecimento mútuo da vida lá fora. O esquecimento é para sempre. Os corpos se abraçam.
Um rangido metálico. Um estalo seco. Eles estão agora mortos. As únicas testemunhas são os cacos de vidro, agora manchados de vermelho. A traição acabou. O tempo que se apressou demais, chegou ao fim.